quinta-feira, 24 de julho de 2008

Us and Them

US AND THEM
(Composição: Waters, Wright)

Us, and them
And after all we're only ordinary men
Me, and you
God only knows it's not what we would choose to do
Forward he cried from the rear
And the front rank died
And the Generals sat, and the lines on the map
Moved from side to side
Black and blue
And who knows which is which and who is who
Up and Down
And in the end it's only round and round and round
Haven't you heard it's a battle of words
The poster bearer cried
Listen son, said the man with the gun
There's room for you inside


[I mean, they’re not gonna kill ya, so if you give ’em a quick short, sharp, shock, they won’t do it again. Dig it? I mean he got off lightly, ’cos I would’ve given him a thrashing, I only hit him once. It was only a difference of opinion, but really...I mean good manners don’t cost nothing do they, eh?]

Down and Out
It can't be helped but there's a lot of it about
With, without
And who'll deny it's what the fighting's all about
Out of the way, it's a busy day
And I've got things on my mind
For want of the price of tea and a slice
The old man died


Tradução

NÓS E ELES

Nós, e eles
E apesar de tudo nós somos pessoas comuns
Eu, e você
Só deus sabe que nós não tínhamos outra escolha
Lá de trás ele gritou para avançar
E o pelotão de frente foi dizimado
E o General sentou, e as linhas do mapa
Se embaralharam
Preto e azul
E quem sabe qual é qual e quem é quem
Altos e baixos
E no fim das contas isto vira um ciclo sem fim
Você não ouviu isto é uma batalha de palavras
O homem do cartaz berrou
Escuta filho, disse o homem com a arma
Há um quarto pra você lá dentro


[Acho que eles não vão te matar, então se você der neles uma estocada rápida, curta, limpa, eles não vão fazer isso de novo. Sacou? Quer dizer, ele caiu fora porque eu poderia ter lhe dado uma porrada, mas eu só dei uma de leve nele. Era apenas uma diferença de opinião, mas realmente... Acho que boas maneiras não custam nada, né?]

Morto e destruído
Não há como evitar mas há muito a respeito disso
Com, sem
E quem vai negar que é esta a razão de toda a luta
Sai do meu caminho, estou num dia cheio
E estou de cabeça cheia
Por não querer saber do preço do chá e da torrada
O homem velho morreu


Análise
A morte do soldado Eric Flecher Waters na Segunda Guerra Mundial, em fevereiro de 1944, ocorreu cinco meses depois do nascimento do seu filho Roger. Não se sabe se foi este o fator determinante para que a fama de um dos maiores ídolos do pop rock mundial se estendesse também para o seu refinado senso crítico em relação aos descaminhos do mundo – principalmente a guerra. Não é à toa, pois, que ‘Us and Them’ pode ser considerada, sem favor nenhum aos grandes poetas clássicos, uma das mais belas – e realistas – construções poéticas sobre a guerra. Nesta canção, temos mais claramente o toque autobiográfico de Roger Waters – toque este que ressurgiria anos depois em dois outros álbuns: ‘The Wall’ (1979) e ‘The Final Cut’ (1983).

Antes de integrar o álbum ‘The Dark Side of Moon’, ‘Us and Then’ foi batizada preliminarmente de ‘The Violent Sequence’ (“A Seqüência Violenta”) para servir como parte da trilha sonora do filme Zabriskie Point (1970), de Michelangelo Antonioni. A mudança do título foi muito feliz, uma vez que permitiu interpenetrar-se à letra um teor lírico. E principalmente isto: com a mudança, o título transcendeu ao caráter estritamente bélico para nos falar das ‘diferenças’ no seu sentido mais amplo: sócio-econômicas, étnicas, raciais... Iniciemos, pois, a análise...

Como um gancho ao título, o início da letra parece nos remeter a uma “reflexão” de um soldado numa batalha em que o front de um dos lados foi dizimado. E o interessante é que a letra não nos explicita de que lado estava o soldado, ou seja, se do lado perdedor ou vencedor da batalha. Afinal, a idéia é exatamente esta: expressar que, a despeito dos lados que brigam, toda a batalha é protagonizada por inúmeros soldados (pessoas comuns); a ralé que forma a base de uma complexa pirâmide hierárquica em cujo topo está o escol, seja este civil ou militar. E na batalha, não há outra escolha senão obedecer às ordens “vindas lá de trás”: “Forward he cried from the rear”. Aqui, fica clara a distinção entre os comandados da linha de frente e o comandante que, na segura retaguarda, mandou os solados avançarem (para a morte). E na posição ainda mais alta da pirâmide, está sentado o general – que, incólume em seu gabinete ante o mapa, manipula seus comandados em traçados estratégicos que, no fim, transformam-se em linhas embaralhadas que só ele entende. Assim, aos olhos dos comandantes, o real horror da guerra (com mortos e feridos) transforma-se em simples cores (preto e azul) no estratagema esboçado num pedaço de papel. A guerra; as vitórias e derrotas; os impérios, no fim das contas, vira um ciclo sem fim, ou seja, as guerras nunca se extinguirão até por conta de algo só explicável pelo fato de o homem, como diz Saramago, ser o único animal capaz de matar não pela sobrevivência – mas pela pura crueldade fomentada pela ganância. Estamos, enfim, na interminável luta entre opressores e oprimidos.

A letra logo em seguida traz um verso que serve de contraponto: “E no fim das contas isto vira um ciclo sem fim”. Veja que este verso divide dois cenários que sugerem o “ciclo sem fim”: o primeiro, que foi visto acima – ou seja, o resultado trágico de uma batalha em que um front foi dizimado (FIM). E o segundo: uma cena urbana que sugere a gestação de uma guerra (INÌCIO). Para entender tal cena urbana, é necessário explicar algo incomum no Brasil e muito comum nos EUA ou Reino Unido. No Brasil (porque o serviço militar é obrigatório), o exército não precisa fazer a “propaganda de campo”, coisa muito corriqueira no Reino Unido e Estados Unidos (onde o serviço militar, há tempos, é voluntário). A “propaganda de campo” é para convencer um jovem entrar no exército e consiste no seguinte: o exército manda para as ruas belos módulos móveis (normalmente trailers) com pessoas muito bem vestidas em pomposas fardas para fazer uma abordagem aos jovens (normalmente pobres e/ ou imigrantes), tentando convencê-los das grandes vantagens de servir ao exército.

Para a compreensão da letra, torna-se conveniente construir a cena urbana imaginada por Waters usando-se três personagens: o primeiro, é um manifestante pacifista portando um cartaz (sugestivamente escrito “paz”); o segundo é um desses aliciadores enviados pelo exército – na letra simbolicamente representado pelo homem portando uma arma; e o terceiro é um jovem rapaz, muito provavelmente pobre. Mais notadamente a partir da Guerra do Vietnã e o advento Woodstock, era muito comum os manifestantes saírem com a palavra “paz” escrita em cartazes e bradando palavras de ordem contra a guerra. E a letra parece mostrar um jovem que, desavisado, passa por uma manifestação dessas e logo em seguida é abordado pelo aliciador para entrar para o exército. Nasce daí a batalha de palavras: “guerra x paz”. Pois o manifestante alerta o jovem para não cair nessa enquanto o aliciador tenta convencê-lo de forma fraternal: “escuta, filho, há um quarto para você lá dentro”, ou seja, com uma mão o aliciador aponta para o trailer dizendo que ali há um quarto, ou, abrigo para o jovem (o que sugere aconchego) – mas com outra mão segura uma arma (o que sugere violência). Logo após este verso, segue-se a “voz de fundo” que assim começa o seu relato: “Acho que eles não vão te matar (...)”. Não é por acaso que Roger Waters (e os produtores) optaram por mixar tal “voz de fundo”. Conforme já foi explicado anteriormente, tais vozes é que dão o tom do “Lado Escuro da Lua” do álbum. Neste caso específico, o "texto" é de Roger the Hat – uma espécie de supervisor operacional do Pink Floyd. Pois ele, que era tido como um bonachão, foi sorteado com a seguinte pergunta: “qual foi a última vez que você cometeu uma violência”. Evidentemente que o referido trecho, descontextualizado do relato completo, fica sem sentido algum. Também a título de curiosidade, o trecho extraído de Roger the Hat foi exatamente a parte final da sua fala, que relata o seguinte caso: ele teria emprestado sua caminhonete para um sujeito que deu carona para algumas pessoas; depois o sujeito, já bêbado, começou a dirigir alucinadamente, quase causando uma tragédia. Após uma discussão com o incauto, Roger the Hat deu-lhe uma “porrada de leve”. Enfim, esta revelação, ou seja, a confissão (do lado violento) é posta justamente quando o aliciador acaba por convencer o rapaz a entrar para o exército.

O refrão seguinte começa curto e grosso; e aparentemente nos mostra qual foi a opção do rapaz (que se deixou seduzir pelo aliciador) – e qual o destino que estaria traçado para ele: “down and out”. Esta expressão, que já fora usada por George Orwell (‘Down and Out in Paris and London’) para se referir a alguém “na pior, ou, no fundo do poço”, também é muito usada no boxe para um lutador nocauteado. Mas no contexto bélico de Waters, seria algo como “morto e destruído”. E a letra emenda: “não há como evitar, mas há muito a respeito disso”. Esta frase (em que ‘guerra’ e ‘morte’ entram como termos elípticos) começa com um conformismo heideggeriano e acaba com uma ressalva platônica. Ou seja: embora a atração exercida pela guerra (e conseqüentemente a morte) seja algo inevitável para o jovem, não é por falta de aviso e conscientização que eles tomam tal decisão.

Eis que, finalmente, chegamos nas duas poderosas palavras-chave que resumem tudo – e que, inclusive, explicam o porquê de ‘Us and Them’ estar bem situado, no contexto do álbum, logo após a canção ‘Money’: ‘With and without’ (“Com e sem”).
O próprio letrista nos ajuda para explicar a frase: “E quem vai negar que essa é a razão de toda a luta?”. Sim, claro: se pararmos para pensar um pouco, chegaremos à conclusão de que todos os conflitos (bélicos, políticos, religiosos, ideológicos, étnicos, sociais etc.) são motivados essencialmente pela ganância do bicho-homem e sua eterna obsessão pelo “ter” – em detrimento do outro (“não ter”). Não vem ao caso, aqui, entrar em teses sócio-econômicas acerca do fato de a guerra ser algo essencial para o funcionamento da gigantesca “máquina capitalista” – já que às custas do bilionário orçamento bélico das grandes potências locupletam-se todos os setores econômicos, principalmente o setor secundário. Neste raciocínio, a ‘instituição guerra’ nos tempos modernos não é, como muitos imaginam, fomentada apenas pelo fator da conquista, mas sim como algo essencial para fazer girar a fortuna dos que sobrevivem às custas das tragédias humanas. Assim, por exemplo, para que o Congresso norte-americano libere bilhões de dólares para o orçamento militar daquele país, é necessário criar um clima instável entre as nações que justifique o investimento cada vez mais alto em tecnologia. E principalmente isto: é necessário que as bombas explodam.

Nos quatro últimos versos, voltamos ao cenário urbano – e ao desfecho que nos revela a opção tomada pelo jovem. Seduzido pelo aliciador, o jovem, agora, parece impacientar-se com os apelos do “homem que portava o cartaz”. A impaciência do jovem (em relação ao pacifista) parece refletir a reação de muitas pessoas quando cruzam na rua mesmo com um pedinte: “sai da minha frente que estou com pressa e sem saco”.

Enfim, os versos que encerram com chave de ouro a bela composição: ‘For want of the price of tea and a slice / The old man died’. A tradução poderia ser “Por não querer saber do preço do chá e da torrada / O homem velho morreu".Para um brasileiro, ou melhor, para um não britânico, estas duas frases, aparentemente, não têm muito sentido. Mas saiba que são belíssimas sacadas de Waters. Para tentar compreender a idéia, iniciemos por evocar o sentido de um conhecido dito: “O seguro morreu de velho”. Em seguida, se substituíssemos o tea (chá) e o slice (fatia de torrada) por “café com pão” a coisa melhoraria, pois são duas “instituições” brasileiras que representam uma refeição mínima para sobrevivência. Na Inglaterra, tal instituição é o chá com torrada.
Mas o que isto tem a ver com o sentido da letra? Bom, as duas frases fecham metaforicamente o sentido dos versos anteriores e diz respeito ao egoísmo daqueles que, por só olharem o seu próprio umbigo, pouco se interessam no engajamento contra as mazelas do mundo. Por isto, vivem bem e sem estresse. Quer dizer: se uma pessoa não é capaz de questionar; revoltar-se; meter a cara num problema que diz respeito a ela própria (no caso, o aumento do preço da sua alimentação básica que, aliás, privaria os pobres de comer), então há grande chance de se ter uma vida longa, ou seja, morrer de velhice.

8 comentários:

ruiarts@bol.com.br disse...

Olá! Michel,gostaria de lhe dar parabéns pelo maravilhoso trabalho que você está fazendo na sicronização e tradução do The Dark Side of Moon e O Magico de OZ.
A parte que me arrepiou dos pés a cabeça foi na hora da tempestade onde começa a música The Great Gig in the Sky fiquei impressionado com sicronismo e o contexto da cena desculpe-me pela expressão mas, ficou muitoo fodaaaa rsr meus parebéns veio e continue esse trabalho fantastico!!! um forte abraço.

Anônimo disse...

Excelente blog, excelente post... estou lendo tudo e estou adorando.

Só estou um pouco preocupado com a questão da tradução.

‘For want of the price of tea and a slice / The old man died’ = "Por não querer saber do preço do chá e da torrada / O homem velho morreu"

Eu não entendi essa tradução. Digo, o certo não seria "Por querer o preço..."?

Não fui capaz de encontrar o "não querer saber" na frase em inglês.

Desculpe-me por comentar apenas pra questionar. Mas não se engane - adorei seu blog.

Abraços.

Michel disse...

Olá Gustavo,

Antes de tudo, obrigado por comentar e principalmente pela consideração ao blog!

No que tange à tradução do Pink Floyd, digo que é extremamente difícil e ingrato, pois toda e qualquer tentativa de fazer uma versão p/ qq outra língua que não o inglês, perde-se no conteudo (sentido) e na poética (métrica, rima etc). Então, temos que partir p/ a tradução livre mesmo...

No caso específico dos dois últimos versos de 'Us and Them'... "For want of" é uma expressão idiomática que significa um antagonismo, ou melhor, "ausência ou falta de"...
Caso deseje, visite uma página interessante de traduções em vários idiomas:
http://www.woxikon.com.br/ingles/for%20want%20of.php

Conforme consta na análise, a intenção do letrista seria contrapor a alienação (despreocupação com os rumos do mundo, o que levaria à longevidade) com o engajamento (as pessoas solidárias que, por serem preocupadas, vivem menos).

Um grande abraço!

Anônimo disse...

"Down and Out/It can't be helped but there's a lot of it about":

"Down and out" eh encurtamento de "down and out of his luck". Quer dizer "na miseria":

"Na miseria...
Ninguem pode fazer nada, mas tem muita pra todo lado"

Por isso as proximas sentencas sao tao apropriadas:

"com e sem"
With, without
Quem negaria que toda guerra eh a respeito de "com e sem"?
And who'll deny it's what the fighting's all about

Como se fosse uma peca de teatro, quem esta falando essas proximas sentencas *nao* eh o narrador, ele esta assistindo alguem na rua tratando um mendigo "normalmente", e a ultima sentenca eh a respeito do mendigo:

"Saia do caminho, estou ocupado hoje"
Out of the way, it's a busy day

"E tenho coisas pra fazer"
And I've got things on my mind

"Por falta de dinheiro prum cafe e um pedaco de pao"
For want of the price of tea and a slice

"(mais)um mendigo morreu"
The old man died

"o homem com a arma" eh uma imagen de guerra, o recrutador militar dizendo "temos muito espaco pra voce aqui dentro".

Uma das forcas mais poderosas de Pink Floyd eh as imagens de guerra que eles usam nas letras.

Abracao.

Rodrigo M. disse...

Primeiramente, excelente análise, já li tudo até aqui e venho gostando muito. Até, descobrindo muitas interpretações profundas e novos termos da língua inglesa. Porém, creio que sua primeira gafe ocorreu nesse texto. É de conhecimento geral, ele afirma abertamente, que Waters crê numa ideologia mais ligada ao socialismo. Isso, de fato, está presente em suas letras. Mas, caro escritor, não tome essas letras como verdades absolutas.
Como você mesmo falou, existem teses e mais teses, trabalhos e mais trabalhos socio-economicos falando do assunto, mas o uso da palavra "máquina capitalista" está extremamente errado. Se você acha que, realmente, o capitalismo defende a guerra, botarei umas indagações para você:
Quem financia a indústria bélica? O estado, não? Mas, se o Estado financia a indústria, ele tem (muito) dinheiro. De onde vem o dinheiro? Impostos, impressão de moeda, etc... MAs capitalismo não é a favor do livre mercado? Que que esse Estado enorme tem a ver então? Capitalismo é pró-MERCADO, e não pró-pobreza, pró-empresas, pró-estado inflado.
A guerra é boa para o mercado ou para o Estado e os "amigos do rei"? E ai? Capitalismo não defende o mercado?

Pense nisso e de quebra também veja que nenhum liberal clássico é a favor das guerras, pelo contrário, paz é um pilar, um dos três fundamentais, do liberalismo clássico, sendo até um atentado aos direitos fundamentais lockeanos, os quais são a base para o liberalismo/capitalismo.
Por favor, leia Bastiat, Mises, Bawerk, Friedman, a Escola Austríaca, a Escola de Manchester, a Escola de Chicago, entre tantos outros, antes de falar que a máquina capitalista necessita da guerra. Isso é só uma velha falácia que, de tanto q foi repetida, parece verdade.

Michel disse...

Rodrigo, antes de tudo obrigado pelo comentário de alto nível. Pelo visto, você defende o liberalismo (ou neoliberalismo), que eu condeno. Logo, esta discussão, embora saudável, não chegaria a lugar algum. É como convencer o torcedor de um time a torcer para o rival rs. Tenho vários argumentos (que não cabem aqui) para dizer que o capital fomenta a guerra e que o Estado está a mercê do poder econômico. É óbvio que nenhum pensador (seja liberal ou socialista) defende a guerra, mas é a prática do poder (político-econômico) que traz os vícios de nós humanos. E daí caímos no campo antropológico, com um histórico nada edificante para a (utópica) paz. Vide a citação a Saramago.

Gabriel disse...

Caro Senhor Michel,

Excelente análise! O Sr. está de parabéns pelo excelente nível de cada um dos textos. Quanto a isso não tenho o que criticar. O único problema é a maneira como foi colocado o militar no contexto: "aliciador". O termo é extremamente pejorativo e mostra (junto com vários outros termos utilizados) um certo "ódio" ou repulsa aos militares, o que de certa forma me incomodou, visto que eu sou um deles. Ora, para que mais serviriam os militares senão para manter a soberania da pátria? Não defendo e nem estimulo nenhum conflito de qualquer espécie, muito menos a guerra, porém sou realista o suficiente para entender que muitas vezes ela se faz necessária. Um país sem defesas é um país destruído Sr. Michel. Imagine o Brasil, o país que abriga a Floresta Amazônica, sem defesas. Não demoraria muito para que outros países botassem em prática um plano para toma-la de nós, e eu digo no sentido "pacífico" (afinal, não há motivos para guerrear contra um povo desarmado).
Nós (militares) não fomos feitos para mover uma "máquina capitalista". Defendemos a pátria e se necessário for, faremos o uso da força para isso e estaremos dispostos a sacrificar a própria vida! Este é o juramento que todo militar faz ao incorporar à sua respectiva força e acho o voto mais bonito e nobre existente. Não é em qualquer esquina que você encontrará alguém que por mais que você insulte, denigra e desmereça, estará SEMPRE disposto a sacrificar a própria vida para que a sua segurança seja mantida. Se o Sr. (ou qualquer outro cidadão) não sente orgulho de ter homens e mulheres com este nível de servidão e amor ao próximo trabalhando para que você, sua família e todos os outros cidadãos estejam seguros, sugiro que leia esta carta de Moniz Barreto ao Rei de Portugal (1893).

"Senhor, umas casas existem, no vosso reino onde homens vivem em comum, comendo do mesmo alimento, dormindo em leitos iguais. De manhã, a um toque de corneta, se levantam para obedecer. De noite, a outro toque de corneta, se deitam obedecendo. Da vontade fizeram renúncia como da vida.

Seu nome é sacrifício. Por ofício desprezam a morte e o sofrimento físico. Seus pecados mesmo são generosos, facilmente esplêndidos. A beleza de suas ações é tão grande que os poetas não se cansam de a celebrar. Quando eles passam juntos, fazendo barulho, os corações mais cansados sentem estremecer alguma coisa dentro de si. A gente conhece-os por militares...

Corações mesquinhos lançam-lhes em rosto o pão que comem; como se os cobres do pré pudessem pagar a liberdade e a vida. Publicistas de vista curta acham-nos caros demais, como se alguma coisa houvesse mais cara que a servidão.
Eles, porém, calados, continuam guardando a Nação do estrangeiro e de si mesma. Pelo preço de sua sujeição, eles compram a liberdade para todos e os defendem da invasão estranha e do jugo das paixões. Se a força das coisas os impede agora de fazer em rigor tudo isto, algum dia o fizeram, algum dia o farão. E, desde hoje, é como se o fizessem.

Porque, por definição, o homem da guerra é nobre. E quando ele se põe em marcha, à sua esquerda vai coragem, e à sua direita a disciplina."

Caro Sr. Michel, se mesmo após a leitura dessa carta ainda persistir algum sentimento de "antipatia" de sua parte em relação aos militares, o meu concelho é que ponha em prática a gratidão e o amor ao próximo que tanto pregamos "da boca para fora" como citado em uma de suas análises do The Dark Side of The Moon.
Gostaria de dizer também algo sobre um outro trecho de sua análise. Os militares norte-americanos que vão às ruas em seus belos módulos, vestindo pomposas fardas para abordar e aliciar pobres e imigrantes estão cumprindo o seu dever. Primeiramente, eu me sinto na obrigação de esclarecer algo. Os belos módulos na verdade não são belos (se você os acha, que bom!), eles são veículos seguros utilizados no combate e na pacificação.

Gabriel disse...

2ª Parte...

As pomposas fardas não são pomposas, elas são operacionais e são a armadura do combatente que protege a vida dos cidadãos e se o termo "pomposos" foi empregado denotando "bonitas", então EXCELENTE!!! A farda é a honra do militar e é com todo orgulho do mundo que a vestimos. Ela representa o que somos: DEFENSORES DA PÁTRIA! Devemos sim manter a farda em alinho e limpa, pois um militar que não se preocupa com o seu fardamento não se preocupa com a sua honra, e um militar sem honra não presta para o serviço (visto que a vida de outros militares vai depender inúmeras vezes da dele). Os pobres e imigrantes aliciados na verdade não são pobres e imigrantes. Eles apresentam a opção do serviço militar à todos e muitos se identificam com os valores militares e aceitam sem pensar duas vezes, aliás, muitas crianças, quando perguntado o que desejam ser no futuro, respondem "MILITAR". Essas crianças não foram aliciadas por nenhuma pessoa de farda pomposa, elas simplesmente se identificam com os valores militares e reconhecem a nobreza da profissão. É importante ressaltar que, como o Sr. já bem nos lembrou, o serviço militar nos Estados Unidos da América não é obrigatório, porém no Brasil é. Muitos pensam nisso como um absurdo pois estão forçando uma pessoa a seguir um destino que não querem, mas tudo isso não passa de um grande mito. Se você for convocado, você serve por um ano e só engaja se for de sua vontade. Eu incorporei à Força Aérea Brasileira com 16 anos de idade por vontade própria e me orgulho imensamente disso. Falando em orgulho, você sabe porque não é obrigatório nos EUA? Simples... lá existem patriotas! A minha maior tristeza é saber que existem pessoas no nosso país que não sabe o Hino Nacional. Quando eu digo patriotismo, eu não digo (como muitos pensam e criticam) que você deve amar o seu governo, não digo que você deve dizer que a situação financeira do seu país é excelente, que a educação é exemplar e que a saúde é de primeiro mundo, eu digo patriotismo no sentido mais puro da palavra: amar a pátria! A pátria é muito maior do que tudo isso, a pátria representa o povo, o território, a história, a honra e a glória do seu país. Tudo isso está resumido em um único símbolo: o pavilhão nacional. Infelizmente tem gente que só sabe o que isso na hora de usar como toalha na praia e em época de copa do mundo...
Não discutirei assuntos como "esquerda", "direita", "socialismo", "comunismo", "capitalismo", etc. Os motivos são simples... você tem o direito de pensar qualquer coisa sem ser obrigado a "condenar" as opiniões divergentes às suas. Eu adoto princípios filosóficos neste ponto e entendo que este é um assunto muito abstrato para ficar delongando. Penso nesse assunto da mesma forma que "certo" e "errado", por exemplo: em algumas regiões do Japão, é certo festejar no velório para que o espírito não fique preso ao mundo material, enquanto que no Brasil isso é extremamente errado e desrespeitoso. São ideologias diferentes, não podemos querer impor os nossos conceitos para alguém que não pensa igual nós, correto?
Por fim, gostaria de lhe dizer que nos meus 21 anos de vida, nunca desprezei, desmoralizei ou humilhei nenhuma classe social, nenhuma raça, nenhuma religião, nenhuma ideologia ou opinião e que eu lhe recomendo adotar isso para a sua vida. Lembre-se, a sabedoria e a inteligência devem andar juntas, pois a ausência de uma torna a outra inútil. Me desculpe qualquer coisa que possa ter desagradado o Sr. pois a minha intenção aqui é apenas alertá-lo para que tome mais cuidado com a maneira com a qual dispõe determinadas palavras em seus textos (excelentes testos, diga-se de passagem).

Obrigado pelo excelente trabalho do blog,

Torres.