terça-feira, 22 de setembro de 2009

A crise de 2008/2009 para o leigo entender

 Passado um ano do início de uma das mais graves crises financeiras da história, julgo interessante uma explicação singela acerca do que realmente aconteceu.

E para que se compreenda a crise de forma clara, elaborei este texto que, na verdade, foi inspirado (e compilado) em algumas explicações que circularam na internet no mesmo caráter metafórico – mas que destrincham a crise de forma bem didática para os leigos entenderem. E aqui repasso para quem tiver paciência em ler.

Antes de começar, vale lembrar que a crise financeira mundial é um somatório de fatores que vêm de muito tempo atrás. Mas só explodiu recentemente em dois fatos notáveis:

- Agosto de 2007 (explosão da crise imobiliária norte-americana);

- Setembro de 2008 (quebra do Lehman Brothers, banco de investimentos norte-americano).

E por que tais datas são importantes? Por que a crise explodiu?

A historinha então, sugestivamente dividida em dois capítulos com personagens e instituições fictícias, é comprida, mas dá uma boa dimensão para se compreender a crise como um todo: origem, profundidade e desdobramento.

A crise para os leigos

Cap.1 - A bolha imobiliária

John, cidadão da classe média americana, comprou uma casa no começo de 1996 por 300.000 dólares financiados em 30 anos pelo Strong Bank.

Em 2001, para amenizar o desarranjo econômico potencializado pelos ataques terroristas de 11 de setembro, o Banco Central americano baixou muito os juros para incentivar o consumo e assim tentar aquecer a economia. A medida funcionou bem principalmente para cidadãos iguais a John que sonhavam com uma casa própria.

Tendo a casa de John como garantia (em tese 300 mil no ativo), o Strong Bank passou a conceder outros empréstimos. Em cada novo empréstimo concedido, mais casas eram hipotecadas ao banco... E quanto mais casas eram hipotecadas, mais gordo o banco ia ficando.

Com a bolha imobiliária, em 2006 a casa de John já estava valendo 1 milhão de dólares. Daí John viu que este era um excelente negócio. E como os imóveis só valorizavam, o banco julgou que era negócio emprestar dinheiro (para compra de imóvel) inclusive para aqueles que tinham “ficha suja” no comércio. Ou seja: se o imóvel entra como garantia no empréstimo, qual é o risco do banco negociar com um consumidor não-confiável? A este tipo de empréstimo para mutuário duvidoso, chamaram de “subprime”.

Ainda faltavam 20 anos para John quitar sua casa, mas o Strong Bank ofereceu um outro empréstimo para John comprar um apartamento no valor de 800 mil dólares. John e a esposa Sandy tinham bons empregos e os dois filhos estudando em boa universidade particular. As perspectivas eram muito boas: comprariam o segundo imóvel, que colocariam para alugar. Uma renda extra é sempre bem-vinda.

Com o mercado imobiliário “bombando”, os imóveis valorizando, mais gente comprando e mais gente contraindo dívida que o banco enxergava como ativo, o Strong Bank (inflado como nunca) abriu um fundo de investimento chamado Easy Money (E.M). Quem aplicasse no fundo E.M. teria participação na engorda que o banco estava obtendo com pessoas espertas iguais a John. Assim, desde pessoas comuns até empresas, inclusive bancos, começaram a aplicar no fundo que estava rendendo muito mais que a poupança. Afinal de contas, os juros estavam muito baixos. Com os juros baixos, a poupança rendia pouco. Como o E.M. era um investimento de risco, pagavam-se juros bem maiores. Mas tratava-se do Easy Money do renomado Strong Bank. Poupança era coisa de burro ou medroso.

Com crédito farto e o dinheiro emprestado do banco, John e Sandy compravam tudo o que viam pela frente. Por intermédio de amigos, ficaram sabendo de outros excelentes negócios imobiliários. E resolveram comprar uma casa em construção num condomínio de luxo. Fizeram nova hipoteca e obtiveram fácil um empréstimo. Com mais grana na conta (e felizes com a perspectiva do futuro) compraram à prestação carros importados para toda a família. Mais: TV de plasma, computadores, roupas de griffe, viagens paradisíacas, cirurgias plásticas, produtos importados... O cartão de crédito era uma festa! Enquanto isso, o resto do mundo, que vendia para os EUA, locupletava-se com a vitalidade da economia americana.

Enquanto John ria à toa, a construção civil, a mola-mestra da economia, começou a nadar de braçada. Estava criado o chamado ciclo virtuoso: muita oferta de trabalho; trabalhadores ganhando dinheiro; os bancos emprestando dinheiro; trabalhadores gastando dinheiro; o comércio lucrando; as indústrias a todo vapor; mais empregos; muitos “johns” investindo em imóveis; muita procura por imóveis (e, por conseguinte, valorização do preço dos imóveis); mais imóveis sendo construídos; muita oferta de trabalho...

Daí o Banco Central americano percebeu que, com o consumo cada vez maior, os preços começaram a subir bem como os imóveis. E para inibir o consumo e assim conter a ameaça da inflação, o Banco Central começou a subir a taxa de juros.

Daí, John começou a perceber que as prestações que estava pagando, que eram pós-fixadas, começaram a subir no compasso da alta dos juros. Até que começou a se enrolar com as dívidas. John conseguiu refinanciar sua casa, mas não conseguia mais pagar aquele apartamento de 800 mil que tinha financiado e tampouco a casa no condomínio de luxo. O Strong Bank tomou, por inadimplência, os dois imóveis de John e colocou-os a venda.

Surgiu outro problema: Fred, que era funcionário da imobiliária do Strong Bank, foi escalado para colocar a placa “vende-se” no apartamento de John. E quando Fred chegou ao prédio, viu que o imóvel de John era vizinho ao que ele também, Fred, estava financiando no valor de 900 mil. Pior: Fred notou que havia outros apartamentos com as mesmas placas. E não era só ali, mas em todos os cantos da cidade. Fred contou isto para o gerente, que concluiu: todo mundo pensou igual a John.

Foi aí que, em agosto de 2007, explodiu a crise imobiliária. E o que foi esta explosão?

Tal explosão foi o contraponto da euforia anterior explicada pela lei da oferta e da procura. Ou seja: com milhares de “Johns” procurando imóveis para investir, o mercado foi sendo inflacionado com absurda valorização. A procura era tanta que a construção civil, na “velocidade máxima”, mal conseguia acompanhar a febre do consumo. É também este fator que, fora a especulação imobiliária, inflacionava o setor. Em suma: os imóveis valorizavam na medida em que muito mais imóveis eram construídos.

Quando todo mundo “acordou” do sonho bom, começou o pesadelo. Mais e mais imóveis dos “Johns” começaram a ser colocados à venda; e na medida em que isto acontecia, o preço caía. Quem vai querer investir num produto cujo preço cai todo dia? Assim, ninguém queria mais investir em imóveis, que perderam a liquidez.

O dinheiro que John juntou durante a vida toda se transformou num único imóvel (em que morava a família) e em várias dívidas. Depois de vender três carros da família e cancelar os planos de saúde, John passou a atrasar as mensalidades dos filhos na universidade.

Cap. 2 - Um ano depois, a quebra do banco

O problema foi se arrastando até que, em Agosto de 2008, Patrick, o dono da universidade onde estudavam os filhos de John (e muitos outros “Johns”), ante a inadimplência dos estudantes, ficou apertado e precisava de dinheiro para pagar as despesas, como os salários dos professores. E foi ao Strong Bank sacar 30 mil dólares que mantinha nos fundos E.M. Mas quando chegou lá, viu que o seu dinheiro tinha virado pó. Por que? Porque, lembre-se, a garantia dos fundos E.M. eram os imóveis hipotecados ao banco, que se desvalorizaram e perderam a liquidez. Alarmados, quase todos os investidores correram para sacar o que tinham investido... E o banco quebrou.

Desesperado, Patrick então correu ao Trust Bank, onde era cliente, para pegar um empréstimo. Quando chegou lá, viu que o Trust Bank também estava em maus lençóis... É que o banco também investiu muito dinheiro no E.M. do Strong Bank. O gerente do Trust Bank informou a Patrick que, embora ele fosse um ótimo cliente, o banco não poderia emprestar o dinheiro – haja vista que, ante a quebradeira geral, ninguém confiava mais em ninguém. Patrick então ofereceu um imóvel como garantia, mas o gerente, constrangido, informou: nessa altura do campeonato, quem é louco de pegar um imóvel como garantia?

O professor Jimmy, que dava aulas na universidade de Patrick, ficou sem receber o seu salário. Jimmy tinha família para sustentar e tinha várias obrigações a serem pagas. Assim, nenhum banco queria emprestar e ninguém tinha mais dinheiro para gastar.

O problema é que bancos europeus e asiáticos também entraram na farra do Easy Money. Muitas indústrias espalhadas pelo mundo também entraram no jogo. Ou seja: chegou-se num ponto em que os empresários achavam que era muito mais negócio arriscar um investimento no E.M., cujo lucro era mais rápido e fácil do que o investimento na própria produção.

Imagine-se então, só para dar um exemplo, as montadoras de automóveis (daqueles carros que John comprou): a indústria automobilística, que também investiu no E.M., perdeu em vários flancos: nas reservas que viraram pó; na quebradeira das concessionárias onde os “Johns” compraram seus carros e na óbvia falta de compradores. E, claro: os milhares de carros usados que os “Johns” venderam para tentar quitar as dívidas inundaram o mercado e fizeram os preços despencarem...

Endividadas, sem reservas, sem compradores e sem lucros, como poderiam as indústrias sobreviver? Resultado: demissão dos funcionários. Estes funcionários então viraram desempregados que pararam de consumir, o que piorou ainda mais a situação.

Ao contrário do chamado “ciclo virtuoso” explicado acima, entrou-se no do “ciclo vicioso”: trabalhadores demitidos; os bancos negando empréstimos; trabalhadores sem dinheiro para gastar; o comércio sem vender; as indústrias quebrando; mais desemprego; os imóveis encalhados e sem liquidez; a construção civil parada...

Enfim, foi disseminado um sentimento generalizado entre os consumidores: a palavra “crise”, que fez todo mundo (mesmo quem tinha renda) segurar o dinheiro em vez de gastar. Tal sentimento coletivo fez surgir uma palavra ainda pior do que a “crise”: recessão. Na “hierarquia” econômica, pior do que a recessão só a depressão, como a de 1929. E a “depressão” no âmbito econômico não está longe daquela mais conhecida no campo da psicologia. Sim: na economia também reside um forte fator psicológico – seja na euforia ou seja na crise.

Neste contexto, para tentar melhorar o “clima econômico”, os governos começaram a criar mecanismos para que os créditos bancários voltassem a funcionar. E o remédio imediato foi a injeção de muito dinheiro nas instituições financeiras para que os bancos voltassem a emprestar dinheiro principalmente para as indústrias em dificuldades.

(Publicado originalmente no Portal Nassif em 22 de setembro de 2009.)

terça-feira, 15 de setembro de 2009

Antes de julgar Nelsinho Piquet, leia isto.

Virou moda a crucificação do Nelsinho Piquet. E desconfio que parte dos petardos que o jovem piloto tem recebido seja herança da convivência nada pacífica que seu pai teve com a imprensa em geral na sua época de piloto - ao contrário de Senna, um craque inclusive na promoção da sua imagem. Mas esta é uma outra história que não vem ao caso.

Concordo com quem está indignado tanto com o chefe da equipe Renault quanto com a atitude de Nelsinho Piquet, que confessou que bateu seu carro de propósito para paralizar a corrida e favorecer seu companheiro de equipe. Não quero, aqui, defender ou justificar a atitude (errada) de Nelsinho. Mas antes de algumas pessoas aparecerem aqui para atacar o piloto brasileiro, é bom que se diga que sua burrada não é sequer inédita ou mais grave do que já rolou na história do automobilismo. Nem mesmo a confissão de que o ato foi deliberado é novidade...

Não sei se alguns comentaristas de plantão têm memória curta ou se simplesmente desconhecem a história não muito remota da F1. Ou então cometem aquela velha mania do "moralismo seletivo" tão comum na nossa imprensa, ou seja, de deixar patente que os erros dos seus desafetos são piores que os erros dos seus protegidos.

Quer ver só?

No último GP (Japão) de 1989, o francês Alain Prost (McLaren) liderava o campeonato e só poderia ser alcançado por pontos por Ayrton Senna (também McLaren). Obviamente, se ambos saíssem da corrida, o líder do campeonato seria o campeão. Mas eis que, quase ao final da corrida, Senna tentou a ultrapassagem em cima do Prost, que deliberadamente "fechou a porta" para provocar um acidente. Prost saiu da corrida e Senna, após ser empurrado pelos fiscais, continuou; parou no box para trocar o aerofólio e acabou vencendo a corrida. Venceu, mas não levou. Porque por conta de uma "patriotada" do presidente da FIA na época (o francês Jean-Marie Balestre), Senna foi desclassificado por ter recebido "ajuda externa" dos fiscais e por ter "cortado caminho" numa ultrapassagem. Resultado: Prost foi campeão. Confira no link abaixo:

No ano seguinte, 1990, no mesmo GP do Japão, a situação no campeonato era inversa: Senna (McLaren) liderava o campeonato e só poderia ser alcançado por Prost (já na Ferrari). E Senna revidou a deslealdade bem na largada. Ambos saíram da pista e Senna sagrou-se campeão. Eis o link:

A melhor resposta para quem duvida que a manobra de Senna tenha sido deliberada está no próprio site "Globoesporte" (Globo):

"Depois do acidente, Prost reclamou muito da manobra, mas de nada adiantou. Mais tarde, Senna confessaria numa entrevista coletiva que bateu deliberadamente, como forma de vingança ao que lhe acontecera em 1989."

Confira no link:

Ante os fatos expostos, se tivéssemos que pôr na balança as gravidades dos pecados cometidos, seria conveniente raciocinar:

- Tanto Senna quanto Prost agiram por contra própria; cometeram uma deslealdade que pôs em risco a própria vida e a do adversário; cada qual agiu de modo a favorecer a si mesmo, "só" com a vitória no campeonato mundial; a deslealdade afetou diretamente o resultado do campeonato.

- Nelsinho Piquet agiu a mando do dono da equipe; cometeu uma delealdade que pôs em risco sua própria vida; agiu de modo a favorecer seu companheiro de equipe e com todo um prejuízo pessoal; ao que tudo indica, a delealdade pouco (ou nada) vai afetar o resultado do campeonato.

(Post originalmente publicado no Portal Nassif em 15 de setembro de 2009. 

sexta-feira, 7 de agosto de 2009

Andam confundindo pandemia com pandemônio

Passado o princípio de pânico ante a pandemia da chamada “gripe suína”, o quadro que temos hoje é bem mais tranquilizador do que o alarmismo advindo dos primeiros casos no México. Pelo que atestam os especialistas, o vírus A(H1N1) não chega a ser tão nefasto como sugeria a sua estranheza inicial. Hoje, sabemos que tanto pelos sintomas quanto pelos óbitos causados pelas complicações da doença (principalmente a pneumonia), a “gripe suína” não é mais grave ou menos grave do que aquela gripe “tradicional” causada pelo vírus conhecido genericamente como “influenza sazonal”. Isto sem contar os diversos outros tipos de vírus cuja proliferação é mais intensa no inverno. 

Segundo informação do Ministério da Saúde, ainda é cedo para especular sobre os efeitos futuros (mutação, agressividade etc.) do novo vírus, mas o fato é que, hoje, o vírus A(H1N1) entrou numa espécie de “competição” com a influenza sazonal. Isto significa que, neste inverno de 2009, somadas a gripe comum e a “gripe suína”, não temos, em termos relativos, um número muito maior de pessoas gripadas em comparação com o inverno de 2008. Da mesma forma, neste ano, o número de mortes causadas pelas complicações da gripe não é, na comparação com 2008, algo alarmante. Vale frisar: “mortes causadas pelas complicações da gripe” não é o mesmo que dizer “mortes causadas pelo vírus da gripe”. O vírus da gripe, diferente do que alguns setores da imprensa insistem em sugerir, não mata. O que pode matar, isto sim, é a desinformação. 

 O que temos lido e assistido na imprensa nos últimos dias em relação a nova gripe são enfoques estritamente sensacionalistas que em nada ajudam a preocupação do Ministério da Saúde de transmitir informação e tranquilidade à população. Em vez disso, ocupam o noticiário nacional com as “mortes causadas pela gripe suína (sic)”, a correria aos hospitais, a fragilidade do sistema de saúde pública e a revolta da população. Ora, não seriam tais notícias os fatores fomentadores de toda essa intranquilidade e caos? É o caso de se questionar: qual a real necessidade de um cidadão comum ser informado que “a gripe suína está matando”? Não seria mais sensato “bombardear” a população com dicas sobre a higiene pessoal e hábitos alimentares saudáveis? Ao que parece, andam confundindo “pandemia” com “pandemônio”, com a prevalência deste último. Chegou-se ao cúmulo de o noticiário televisivo mostrar um estádio de futebol com quase toda a torcida usando máscaras para “proteção contra a gripe”, como se residisse sensatez em tal providência... Até onde chegará, por parte da mídia, a propaganda da desinformação e estupidez? Cadê o papel social da imprensa? 

Nos países mais desenvolvidos em que o A(H1N1) se espalhou, o clima que ora impera é de tranquilidade. Nos Estados Unidos, por exemplo, onde a nova gripe chegou forte (quando então era inverno por lá), o noticiário foi muito mais informativo do que alarmista. Não houve, portanto, o enfoque dramático como este com que a imprensa brasileira tem tratado do caso. O resultado é que a população norte-americana, no geral, continuou levando uma vida normal a tal ponto que, hoje, não há qualquer notícia; qualquer vestígio traumático da passagem da “gripe suína” pela América do Norte, onde ocorreram os primeiros casos. 

No mais, deixo aqui os links da esclarecedora entrevista que o ministro da saúde, José Gomes Temporão, falando sobre a nova gripe, concedeu ao programa do Jô Soares:

segunda-feira, 4 de maio de 2009

A tragédia da educação em São Paulo

São Paulo tem tido um desempenho medíocre no Exame Nacional de Ensino Médio, o Enem. Este dado, posto assim no contexto sofrível da educação (pública e privada) no Brasil, passa despercebido. Mas não deveria. Afinal, São Paulo é, disparado, o Estado mais rico da Federação. A despeito disto, as escolas localizadas no Estado (computadas as públicas e privadas) obtiveram, na média geral, o sexto lugar no ranking nacional.

O alarme para o fraco desempenho dos alunos paulistas pode ser dado na própria lógica buscada na estatística: quanto melhor o nível socioeconômico do estudante, maior a chance de se obter um bom desempenho no âmbito nacional. Pois não seria óbvio que tal fator ajudasse os estudantes do Estado de São Paulo? Ao contrário disto, a escola estadual paulista mais bem posicionada no ranking do Enem está numa longínqua 2.596ª posição. E poderia ser pior. Pois segundo reportagem da Folha de São Paulo, o diretor da tal escola (Escola Lúcia de Castro Bueno, em Taboão da Serra) só conseguiu tal "façanha" porque vai contra as orientações da Secretaria Estadual de Educação que, segundo ele, "só atrapalha". E outra reportagem da Folha já apontava, um ano antes, que o pífio desempenho de São Paulo no ENEM 2008 conseguiu ser pior do que em 2007, quando a melhor escola estadual de SP emplacou a 913ª posição.

Outro fator preponderante está no ranking das 20 melhores escolas do Brasil: São Paulo emplacou apenas quatro escolas, sendo que a melhor delas aparece em modesto oitavo lugar. A coisa piora se formos analisar o total de escolas avaliadas em cada Estado. Só de pegar a região Sudeste, já dá para se ter uma idéia da discrepância:

Espírito Santo: 470 escolas avaliadas;

Rio de Janeiro: 2.073 escolas avaliadas;

Minas Gerais: 2.913 escolas avaliadas;

São Paulo: 5.923 escolas avaliadas.

Ora, se conduzirmos o fato para o campo da probabilidade matemática, a coisa toma uma dimensão escandalosa: em número de escolas avaliadas, São Paulo tem quase o dobro de Minas Gerais, então o segundo maior Estado a oferecer escolas para o crivo do Enem. Atente-se ainda para o fato de que o número de escolas avaliadas em São Paulo (5.923) é maior do que a soma dos outros Estados do Sudeste, ou seja, 5.456 escolas avaliadas. Veja que Espírito Santo, Minas Gerais e Rio de Janeiro, juntos, puseram 12 escolas no ranking das 20 melhores do Brasil, contra apenas 3 de São Paulo.

E se levarmos em conta as 100 melhores escolas avaliadas no ranking, a coisa fica mais turva ainda para as instituições de ensino localizadas em São Paulo, que aparecem em terceiro lugar, com 20 escolas - em comparação com o Rio de Janeiro, com 29 escolas entre as 100 melhores, ou Minas Gerais, com 23 escolas.

Diante dos fatos aqui analisados, parece claro que alguma coisa (não) acontece na educação em São Paulo que precisa ser urgentemente revisto. Espero que tal problema não descambe, como sempre, para a peleja política que mira 2010 – fator, aliás, que tem equivocadamente tirado os holofotes das discussões dos grandes problemas nacionais, como a já tradicional má vontade política para curar nossos abismos educacionais. E para a cura do mal, não são necessárias mágicas ou grandes esforços de criatividade: basta o governante seguir o que prescreve o capítulo III da Constituição Federal.

Fontes:

UFU – Universidade Federal de Uberlândia

UOL

INEP

Folha

(Publicado no Portal Nassif em 04 de maio de 2009)